1-Uma caixinha de
fósforos
2-Uma borboleta morta
3-Um caco de taça de
champagne
4-Uma sempre-viva
5-Um caderninho em
branco
São cinco coisas que eu
faço questão de te devolver. Elas foram suas por algum tempo, mesmo que você
tenha tomado à força algumas delas. Como no caso da caixinha de fósforos, que
você tomou da minha mão quando nos conhecemos. Eu estava andando com a Ana e
você surgiu do meio de umas barracas de bebida barata—uma
aparição vinda do escuro da noite; tão bonito e confuso quanto a ausência do
sol—e me
cutucou perguntando se eu tinha fogo. Achei meio estranho isso de me pedir fogo
sem nem falar um “com licença”, mas peguei uma das caixinhas de fósforo que
tinha comprado pra minha coleção e entreguei na sua mão. Você acendeu um
cigarro e começou a puxar assunto com nós duas, algo sobre seus amigos terem
ido embora mais cedo e você estar procurando companhia pra ficar até mais
tarde. Eu deveria ter te ignorado no momento em que você começou com esse papo
estranho e seguido pro bar com a Ana, mas não, eu tava achando o máximo ver
seus olhinhos perdidos, apertadinhos; você sorria por nada, sorria de bobeira.
Depois desse dia, que obviamente você me beijou e falou como achava o
máximo eu fazer coleção de caixinhas de fósforo, você decidiu que iríamos ao
cinema. Você sempre decide as coisas porque a consequência delas nunca te
atinge. Fomos ao cinema. Nem consigo lembrar muito bem sobre o que era o filme
porque era tão chato...e eu estava muito preocupada em ficar olhando pro seu
rosto, na forma largada que você se sentava e ficava batendo os dedinhos no
braço da poltrona enquanto os trailers passavam. Você passou o braço por trás
de mim deu por missão cumprida; toda a atenção que você achou que eu precisaria
seriam resolvidas com aquele braço. Você viu o filme inteiro.
Na saída do cinema eu fiquei sorrindo pro chão pensando em como eu era
boba em ficar boba com um casinho de dois dias e um cinema. Aí você me puxou
pela cintura, me deu um beijo e arrumou meu cabelo de lado. Disse que achava
divertido ver uma garota com gravata borboleta e eu achava o máximo ser a sua
garota divertida. Andamos mais alguns passos e você pegou uma borboleta morta
no canteirinho de uma árvore e deu na minha mão. Foi o presente mais tétrico
que eu já tive, mas foi o único que você conseguiu me dar. Ainda ficou uma meia
hora explicando sobre a anatomia, modo de viver e comida predileta das
borboletas. Eu fingi um sorriso enquanto olhava pro bichinho morto comparado à
minha gravata.
Pulando a ordem da lista você poderia dizer que já me deu outro presente
sim, como é o caso dessa sempre-viva. Mas não considero um presente porque
naquele dia no parque, eu a vi na lojinha de plantas e fiquei apaixonada. Em um
ato de violência contra mim e de heroísmo pra você, você roubou a plantinha, me
puxou pra esquina e me entregou. Não sei como aceitei o roubo e o prazer da
adrenalina naquele dia.
Depois do cinema você ficou uns três dias sem dar o menor sinal de vida
até me ligar na noite do quarto dia, dizendo que na sexta você comemoraria seu
aniversário com uns amigos na casa de um tal de Isaac. Fiquei animada com a
possibilidade de fazer parte de eventos íntimos da sua vida.
Como você dizia que gostava de escrever, eu encomendei pela internet um
caderninho muito fofo para te dar de aniversário. Esse caderninho. Ainda bem
que ele chegou só hoje e não no dia da festa, porque agora percebo como é
surreal você repetir os erros do mundo de uma forma tão despreocupada; como
gostar de escrever e não de ler.
Outro erro batido e clichê foi seu aniversário na casa do Isaac, um
menino muito rico com o coleguinha abusado (você) que usa a casa e a amizade
para construir um palácio de loucuras. Cheguei atrasada e você me recebeu na
porta. Tentei justificar, olhando pro chão, como o seu presente não tinha
chegado ainda, mas que assim que chegasse você iria gostar bastante. Acho que
você não ouviu uma palavra do que eu disse porque me cortou no meio da frase e
me apresentou uma loirinha de propaganda de margarina como “essa é a Carol, a minha
ex”. A tal Carol sorriu para mim como se eu fosse a câmera da propaganda de
margarina e eu fiquei sem reação... Eu deveria fazer o que com
a-Carol-loira-bonita-ex-do-bem? Ela me deu um abraço e você me puxou para
apresentar a sua “galera”, que não deu a menor bola para a minha presença.
Enquanto vocês estavam super chapados o Isaac ficou conversando comigo e
se mostrando o anfitrião mais fofo possível. Alguma coisa tinha que estar
razoavelmente boa naquele lugar.
Foi mais ou menos lá pela meia noite que Isaac decidiu abrir umas
garrafas de champagne para brindar seu aniversário (o carinho de Isaac por você
é evidentemente uma paixão, mas você ignora). Todo mundo recebeu uma taça
repleta daquela bebida meio metida quando você, já mais louco que o normal,
decidiu que queria brindar comigo e Carol juntas. Sua força quebrou a taça na
minha mão e me deixou encharcada. Enquanto você e Carol riam de bêbados da
Carrie, a estranha, Isaac correu comigo pro banheiro para me ajudar. Como
cortei meu dedo com esse caquinho, resolvi te entregar essa lembrança da sua
enorme preocupação com os outros.
Fui embora imediatamente e você recebeu a notícia com um “ah tá...que
pena, achei que você fosse dormir comigo”. Você e a maioria da sua galera deve
pensar que é um escândalo eu ficar com raiva de você já que não fui “traída”,
nem falaram mal de mim, mas talvez vocês não alcancem os cuidados e
preocupações que cercam o mundo que vive fora de vocês. O que começa mal,
sempre termina mal. E como todo desastre tem sua caixa preta, como todo drama
tem presságios e avisos; te devolvo nessa caixinha todos os sinais e provas de
que nós nunca existimos e nem vamos dar certo. Não atendo mais suas chamada,
mas não por te achar uma pessoa errada, mas é que seu destino é diferente do meu.
Eu não sei fazer propagandas e nem viver em palácios.