sexta-feira, 20 de junho de 2014

P´tit Coquelicot



 Quão agoniante é o momento em que você percebe que tudo o que você sempre buscou está bem na sua frente? Como não se desesperar quando esse momento te mostra que você está agoniado porque nunca sonhou com nada, nunca quis nada. A gente só percebe o que falta quando aquilo que completa aparece?
"Antes do Inverno" é sobre essas perguntas e toda a experiência excruciante que elas trazem ao protagonista Paul.
 Paul é um neurocirurgião rico, com uma mansão moderna que abriga um jardim aberto à visitação. Sua mulher, Lucie, de aparência mais moderna que sua mansão, é o tipo antiquado de dona de casa que larga tudo para viver cuidando do palácio construído pelo marido enquanto ele consegue mais alguns montes de dinheiro para não gastar.
 Apesar da traição ser apresentada primeiramente como um problema para o casal, ela logo é ignorada e vista como a menor das preocupações. Não é segredo que Lucie e o melhor amigo de Paul vivem um romance que nunca aconteceu. O que consequentemente faz com que o romance também não vivido por Paul e sua ex paciente Lou Vallé, seja um não segredo.
 Quando esse romance começa na vida de Paul, ele surta. De primeiro ele se surpreende quando sua ex paciente o persegue deixando rosas em todos os lugares onde ele vive, se consulta com seu melhor amigo e está sempre nos mesmos lugares que ele. É o sonho perseguindo o sonhador. Engraçado, não? Apenas quando Paul aceita que Lou é tudo o que ele não esperava de alguém (e justo por isso ele a ama), que ele a aceita em sua vida. Sua mulher, Lucie, se revolta, é claro. Não pela traição, mas pela forma como Paul desistiu do casamento sem nem ao menos tentar. Ele não tem medo de ser covarde, de ser egoísta.
 Como funciona uma vida onde tudo é um excesso material? Cria-se uma bolha translúcida e sufocante que te impede de ver e viver coisas novas, erros novos.
 O romance entre Paul e Lou machuca os dois, não tem sexo, beijos ou carne, só amor. Um amor que vai permanecer até o final quando descobrimos que Lou não existe, é uma personagem inventada por uma imigrante  ilegal e assassina. Uma psicopata que busca homens mais velhos para seduzir e matar. Nesse momento do filme é que dizemos como Paul é um idiota por ter acreditado nas palavras de Lou-ou-não-se-mais-quem, que foi um egoísta em ter jogado seu casamento de anos fora. Mas não, Paul sabe muito bem que ele não foi enganado. A mulher pela qual ele se apaixonou estava ali.
Paul escuta as pessoas falarem que ele foi enganado junto com a notícia de que ela tinha se matado na banheira do seu apartamento/submundo. Ela se mata para não se obrigar a matar ele, ela se afasta por isso.  A necessidade de matá-lo pode ser maior que a beleza de senti-lo vivo; então, por amor, e doente da cabeça e do corpo, ela se corta com uma faca na banheira. Recria-se então uma cena que não aconteceu com Marat e a Revolução, um suicídio da loucura. Será que todos aqueles que se percebem poderosos sobre e com os outros, morrem na banheira?
 Indo, Lou deixa para Paul uma música sobre uma papoula, sobre amor, sobre sonhos... O ópio era usado dessa forma, não? Por aqueles que sabiam ser enganados e justo por isso corriam atrás daquele vazio que se transformava em nuvens de fumaça multicor.
 Acabei não explicando o que eu vi do filme, só mostrei quantas perguntas ele me deixou. Talvez eu não tenha entendido direito...Mas eu sei que Paul entende, e isso me conforta.

sábado, 7 de junho de 2014

Dia da Mãe

Mamãe, ainda é ruim te chamar assim? Qual a relação que nós mantemos com essa infância dentro de nós, onde mães e Georginas, serão sempre Mamães?
Existe sim essa ligação umbiliexistencial com as mães, não é? É estranho pensar que aquela pessoa que nos educa e torce pelo nosso crescimento se importa tanto com alguém que não seja ela mesma. Talvez o egoísmo e a hipocrisia não conseguem atingir a mãe. Porque em todas as outras esferas da humanidade eles estão presentes.
Isso tudo parece uma visão meio romântica e cafona sobre a maternidade, mas não é. Não é porque eu não acho que seja o amor que mantém e que cria essa relação entre mãe e filho, mas a projeção do sangue materno no espírito de um ser humano em eterna formação física e psicológica. Essa projeção nem sempre se dá no nascimento, as vezes as mães chegam atrasadas, mas na hora certa, na vida dos filhos que não nasceram delas (mas com elas), e dão o sangue mesmo assim.
Dar o sangue foi o que você me ensinou dentre muitas outras coisas que eu ainda não consegui aprender. Dar o sangue pelos outros, dar o sangue pela honestidade e pela alegria. Sofrer para ser feliz e ser feliz sofrendo. Poderia listar as milhões de coisas que você me ensinou, mas isso todo mundo sabe e isso ainda não é o ponto principal dessa nossa relação.
Esse capilar flexível que nos conecta é o mesmo que nos liberta um do outro; é dessa liberdade de ser quem eu quero e você ter sido quem você quis, que nos faz parceiros, nos faz presentes. Saber que eu posso caminhar longe e pra longe de você é justo o que me mantém do seu lado.
Te amo por aquilo que você se tornou e por me mostrar que ninguém nasce assim, se torna. Te amo por esse se tornar, a perfeição em não nascer pronto, em poder escolher o caminho que for para onde for.
Aniversário é isso, então? um dia para se agradecer a presença do outro?
Talvez...Para mim, aniversário é o dia para perceber como, quando e por que essa pessoa existe para você.
Você existe.

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Yeats, Hauden, Dante e Callas.

"O intelecto do homem é forçado a escolher a perfeição da vida ou do trabalho" (Yeats)

Quando eu li essa afirmação de Yeats citada por Hauden em um texto sobre escrita, eu tive que parar (sim, porque eu costumo ler andando). Parei porque eu tenho um raciocínio lento e esse tipo de afirmação complicada, perigosa, tendenciosa talvez, me deixa anestesiado por um tempo. Claro que eu poderia ter passado direto por essa frase, já que nem mesmo Hauden concorda com ela, mas se tem algum obstáculo no caminho é porque ele precisa de atenção.

Hauden, para completar o meu desconforto, diz ser impossível alcançar a perfeição nos dois casos. Mas o que faz o homem um ser perfeito não é justo a busca pela perfeição? Não se trabalha para um vida perfeita? Melhor, não seria a perfeição algo tão inútil quanto a arte?  Eu me vejo desarmado em um mundo onde é preciso saber o significado de todas as palavras...intelecto, home, perfeição, vida, trabalho...

Talvez não exista vida ou trabalho, somente a busca. O que nos move não é o final mas o processo. Talvez possamos começar pensando no final, mas o durante é o que nos completa. Como Dante passando por três planos espirituais ao passo que caminha por três níveis de auto conhecimento para encontra a Beatriz.

Discordando então da afirmação de Yeats e ao mesmo tempo da de Hauden, eu diria que não é impossível conseguir a perfeição, ela é apenas dispensável. O homem aprendeu bastante ao longo dos anos o que a perfeição pode trazer de decepções ou solidão. Tosca e Vissi D´Arte! Ou indo mais fundo: Maria Callas como Tosca cantando Vissi D´arte; é a conclusão que a arte nos dá de que o perfeito é um castigo. Isso sem precisar entrar em detalhes mais completos da vida difícil de Callas e da personagem Tosca.

O abraçar o mundo inteiro, o atirar para todos os lados, o absorver de toda informação para alcançar o perfeito, termina em um sala clara/escura sem janela, porta, teto ou chão. Mas mesmo sabendo disso, a gente simplesmente para? Eu acho que não...Se me fosse possível perguntar alguma coisa aos dois escritores, eu gostaria de saber como é que o homem consegue passar gerações atrás de uma coisa que ou ele nunca vai conseguir, ou que nunca lhe trará nada.

https://www.youtube.com/watch?v=NLR3lSrqlww